EXPEDIÇÃO MONTE RORAIMA 2017 PARTE IV

Na manhã do dia 08/11/17, iniciamos o caminho de volta pra casa. Planejamos o primeiro pernoite em São Luís-Ma, distante 582 km de Belém, incluindo uma travessia de Ferry-Boat pela Baia de São Marco, que parte do Terminal de Cojupe-Alcântara-Ma, até a Ponta da Espera em São Luís-Ma. Como a procura pela travessia no Porto é muito grande, fizemos uma Reserva On-line para as 15:30 e cedo pegamos a estrada, sempre aguardando a confirmação da nossa reserva que chegaria por e-mail. Em dias de grande movimento, os navios chegam a transportar em média 5.000 pessoas e 1.050 veículos. Conseguimos chegar na hora marcada mas a confirmação da nossa reserva  não aconteceu e tivemos que enfrentar uma longa fila que só nos deu a chance de embarcar no segundo ferry já por volta de 18:00 horas. Para dar vazão a demanda, são utilizadas embarcações de grande porte com capacidade para 1.000 passageiros e 70 veículos,  numa travessia de 23 km que normalmente é feita em uma hora e  meia. Como ventava forte e a maré estava subindo, levamos quase duas horas para completar o percurso e quando desembarcamos já passava de 20:00 horas. Fomos  direto para o hotel de onde só saímos no dia seguinte. Dia 09/11/17, continuamos viagem por 530 km, com destino a Barra Grande no Litoral do Piauí, seguindo um caminho que pelo Trade Turístico é conhecido como "Rota das Emoções". Passamos pelo município de Barreirinhas, porta de entrada dos Lençois Maranhenses e paramos em Tutóia, onde abastecemos a nossa caixa térmica com o melhor camarão marinho encontrado no Nordeste, que se destaca dos demais pelo seu sabor e tamanho. Diferente do camarão criado em cativeiro, em Tutóia ainda se pratica a pesca artesanal de arrasto em águas marinhas, onde estão os principais bancos camaroeiros do Brasil. Por volta de 17:30horas chegamos em  Barra Grande e pela segunda vez ficamos hospedados  na Pousada Torre de Chocolate. Nessa ocasião,  optamos por uma tenda num espaço ao ar livre batizado de "pé na areia". A tenda acomoda um casal confortavelmente e no espaço são oferecidos banheiros coletivos, redarios, deck com mesas e equipamentos para o preparo de café e refeições, além de uma grande piscina num belo jardim ao ar livre. Tudo isso a 50 metros da praia. A nossa vontade era ficar ali por mais um dia mas os camarões que compramos em Tutóia nos impediram de tomar essa decisão pela dificuldade de encontrar espaço no freezer do hotel para garantir a sua conservação. Dia 10/11/17, acordamos cedo, fizemos uma caminhada pela praia e depois do café seguimos viagem por 450 km até chegar na nossa casa em Fortaleza-Ce, concluindo assim a nossa Expedição ao Monte Roraima. Todos os anos milhares de pessoas do Brasil e do mundo visitam a Amazônia mas poucos podem dizer que a conhecem e o motivo é simples. Só uma viagem de férias ou mesmo uma grande expedição não bastam. Nem os povos da floresta que ali passam uma vida podem dizer que a conhecem porque só uma vida também não basta. Passamos muitos dias da nossa expedição na floresta, vivenciado experiências e desafios mas tudo que conseguimos conhecer é muito pouco diante dessa imensa reserva natural que a todos impressiona pela sua grandeza, variedade de paisagens e histórias repletas de lendas, encantos e mistérios.

 

No segundo dia 07/11/17, reservamos uma parte da manhã para conhecer o Mangal das Garças onde uma pequena amostra da flora e da fauna amazônica se apresentam como protagonistas num espaço muito bem cuidado. Caminhamos por dentro de um grande viveiro repleto de aves amazônicas e de um imenso borboletário com várias espécimes. O parque possui uma área de 40.000 metros quadrados à beira do Rio Guamá, numa área verde por onde circulam livremente dezenas de garças e guarás. Também fazem parte do complexo o Farol de Belém que é um mirante de 47 m com uma bela vista da cidade, o Memorial Amazônico da Navegação, onde estão expostas antigas embarcações e equipamentos náuticos e o restaurante Manjar das Garças que apresenta um cardápio  variado servida em forma de bufê durante o almoço. O restaurante também abre para o jantar com ótimas opções a lá carte. Gostamos muito do local e já deixamos uma mesa reservada para o jantar. Seguimos para o Espaço São José Liberto que foi construído em 1749 pelos frades capuchinhos para funcionar como convento, sendo que depois funcionou como quartel, hospital  e cadeia pública. Hoje, transformado em centro cultural tornou-se uma referência e um dos principais pontos turísticos de Belém. Lá visitamos o Museu de Gemas do Pará, o Polo Joalheiro, a Casa do Artesão e o Jardim da Liberdade montado num agradável pátio interno típico das construções coloniais. No Museu de Gemas, um dos mais representativos do país,  existem cerca de quatro mil peças expostas entre ametistas, esmeraldas e granadas provenientes de várias regiões do Pará, de alguns Estados brasileiros e até de países latino-americanos. No Polo Joalheiro observamos o trabalho de ourives que durante as visitas permanecem em plena atividade. Na Casa do Artesão compramos algumas peças do artesanato local e a famosa cachaça de jambu que se diferencia das outras aguardentes pela sensação de dormência e formigamento que causa nos lábios, língua e céu da boca, o que proporciona uma experiência  bastante exótica. Seguimos para o centro da cidade onde visitamos o  Theatro da Paz cuja fundação data de 1878, período em que ocorreu um grande crescimento econômico na região amazônica impulsionado pelo período áureo do ciclo da borracha. A cidade de Belém, considerada na época a "Capital da Borracha" apesar muito próspera não possuía uma casa de espetáculos para receber as grandes companhias líricas que se apresentavam pela Europa. Para satisfazer os anseios dos "Barões da Borracha" como eram chamados os ricos produtores de latex, o governo mandou construir uma obra monumental inspirado no Teatro Scalla de Milão. Hoje o Teatro da Paz figura na lista do IPHAN como um dos mais importantes Teatros Monumento do Brasil. Na sequência visitamos a suntuosa Basílica de Nossa senhora de Nazaré onde a cada ano, no segundo domingo do mês de outubro é realizado o Círio de Nazaré, considerada a maior manifestação religiosa do Brasil e uma das maiores do mundo, chegando a reunir mais de dois milhões de pessoas que seguem em procissão pelas ruas da cidade até a Basilica. Essa manifestação foi declarada em 2013 pela UNESCO, como Patrimônio Cultural da Humanidade. Fechamos o dia na barraca da Dona Maria onde é vendido o mais famoso tacacá da cidade. O endereço fica na esquina da Avenida Nazaré com Quintino Bocaiúva, onde por 45 anos a Dona Maria do Carmo trabalhou até falecer aos 75 anos, deixando como legado a citação do seu nome nos principais guias turísticos e gastronômicos do Brasil e do mundo. Considerado um dos símbolos da gastronomia do Pará, o tacacá na verdade não é um prato e sim uma bebida afrodisíaca servida em uma cuia, herança dos povos europeus, africanos e indígenas. Hoje o negócio deixado por Dona Maria é administrado pelos seus filhos que dão continuidade a tradição. A noite fizemos um city tour pelas ruas de Belém que já estavam decoradas para o Natal e na companhia do casal de amigos Rubens e Andreia, fomos jantar no Restaurante Manjar das Garças um prato de Peixe Filhote ao molho de castanha do Pará, acompanhada da tradicional "cerpinha" uma cerveja fabricado em Belém há mais de 50 anos, que conquistou a preferência dos consumidores, mesmo antes do avanço das cervejas artesanais e até  hoje goza de grande reputação no mercado cervejeiro nacional.

No primeiro dia 06/11/17, acordamos  cedinho e chegamos por volta de 9:00horas no Mercado-Ver-o Peso, que juntamente com o Forte do Presépio, forman o marco zero da cidade e são duas grandes atraçõoes turisticas. Ali estão concentradas as barracas com vendas de "simpatias" que fazem parte do misticismo paraense, frutas tropicais  e as comidas mais populares da sua culinária como o pato no tucpi, açaí, tacacá e maniçoba.  Circulamos pelo mercado do peixe onde pescados frescos como pirarucu, filhotes, tucunarés e diversos outros peixes amazônicos começam a chegar ainda na madrugada para serem comercializados. Andamos com cuidado pelo cais, sempre atentos aos nossos pertences pois o registro de roubo de máquinas fotográficas, celulares e carteiras é constante na area. Depois de fazer algumas fotos e tomar um suco de cupuaçu feito da fruta, caminhamos na direção da Praça Dom Frei Caetano Brandão até encontrar  a Igreja de Santo Alexandre, que abriga o Museu de Arte Sacra e a Catedral Metropolitana de Belém. A história da cidade passa por outros dois pontos emblemáticos que também visitamos na mesma praça. Trata-se do Forte do Presépio e da Casa das Onze Janelas. O Forte do Presépio foi construído pelos portugueses às margens da Bahia de Guajará onde se deu origem a cidade,  cuja função estratégica era proteger a província que na época era chamada de Feliz Lusitânia, contra os invasores. Hoje no local funciona o Museu do Encontro que reproduz a chegada da colonização portuguesa na Amazônia. Na parada seguinte, visitamos a Casa das Onze Janelas que no passado foi residência de um senhor de engenho e hoje abriga nos seus aposentos um centro cultural onde estão expostas obras de vários artistas brasileiros, entre eles Tarsila Amaral. Ali também funcionou o Boteco das Onze que foi considerado um dos melhores restaurantes da cidade mas hoje está fechado. No Píer da Casa das Onze Janelas, está ancorada a Corveta Solimões que foi transformada em museu e fica aberta a visitação pública. Na hora do almoço procuramos a Estação das Docas, que num projeto de revitalização  parecido com o Puerto Madero dos nossos hermanos de Buenos Aires, transformou uma área de armazéns abandonados num concorrido centro de entretenimento com vista para a Baía de Guajará. Vários restaurantes típicos oferecem as maravilhas da culinária paraense num ambiente limpo e agradável que contrasta com o popular Ver-o-Peso. Depois do almoço continuamos visitando as lojas que vendem artesanato e paramos para tomar um sorvete na tradicional Sorveteria Cairu que desde a década de 50 faz sucesso com os sorvetes de frutas amazônicas. O tour na Estação das Docas se completa com o por do sol e a visão iluminada tanto da estação quanto do entorno da Baía, que serve de aperitivo para um papo descontraído na cervejaria artesanal Amazon Beer onde é servido o inusitado chopp com sabor de bacuri. 

Deixamos Alter do Chão na manhã do dia 04/11/17 em direção a Altamira, cujo percurso pela BR-163 e depois pela BR-230 (Transamazônica) seria de 540 km. Conversando com o proprietário da pousada, ele nos orientou que ao invés de seguirmos pela BR-163, havia a alternativa de  um atalho por uma estrada de chão na direção de Belterra, depois seguiríamos rumo a Hidrelétrica de Curuá-Una, margeando a Floresta Nacional do Tapajós, até alcançarmos a cidade de Uruará. Fazendo esse trajeto ao invés de seguirmos a orientação do GPS, o percurso seria reduzido em 170km aproximadamente, só que iríamos percorrer a partir  da Hidrelétrica de Curuá-Una, 150 km por trilhas na floresta, numa região totalmente desabitada que normalmente é utilizada pelos madeireiros. Quando estávamos navegando pelo Rio Amazonas, um rapaz que mora em Santarém e faz parte do Jeepclub da cidade, já havia nos falado sobre esse atalho que eles usam para fazer trilhas offroad, mas não nos aconselhou que fossemos por ele devido aos atoleiros e por ser um caminho muito isolado e às vezes perigoso. Como já havíamos enfrentado as condições adversas da BR-319, ignoramos a recomendação é resolvemos topar o desafio. Como a estrada não tinha sinalização,  pedimos algumas  informações até que chegamos nos limites da Hidrelétrica. Para continuar pelo atalho, recebemos autorização numa guarita de controle e passamos por dentro da Usina Curuá-Una que fica há 70 km de Santarém e é responsável pelo suprimento de energia da cidade. No portão de saída o segurança nos informou que teríamos a partir dali  mais 150 km de estrada de chão até o entroncamento com a Transamazônica na cidade de Uruará. Seguimos viagem e em alguns pontos avistamos "picadas" que enveredavam pela mata fechada, junto a barracos de palha onde haviam máquinas paradas e tambores de combustível, mas sem ninguém por perto, como se as pessoas tivessem desaparecido ante a nossa aproximação. Em todo o percurso encontramos com no máximo meia dúzia de carros, entre eles duas carretas que seguiam na nossa frente levantando muita poeira, carregadas com imensas toras de madeira que não sabíamos se tinham origem legal ou se foram extraídas de forma clandestina pelos madeireiros que agem na região e costumam trafegar  por estradas que são abertas e mantidas por eles mesmos, portanto sem nenhuma fiscalização. No final da tarde chegamos na cidade de Altamira onde pernoitamos. No dia seguinte 05/11/17, seguimos pela Transamazônica com destino a Belém. Na primeira hora de viagem,  nos deparamos com a polêmica obra da  Usina de Belo Monte, cujo projeto iniciado há mais de quarenta anos ainda causa polêmicas até hoje. O mega empreendimento que no projeto inicial previa o alagamento de cerca de 20 mil quilômetros quadrados de uma grande área da Floresta Amazônica, de imediato chamou a atenção da comunidade ambientalista internacional que passou a cobrar explicações do governo brasileiro. Em 1989, por ocasião de  uma audiência em Brasília com comunidades indígenas que seriam inundadas pelo lago, um protesto inesperado gerou uma imagem tensa e muito forte que correu o mundo. Numa ação intempestiva, a Índia Tuíra esfregou o seu facão contra o rosto do presidente da Eletronorte, deixando todos os participantes perplexos e sem ação, inclusive o cantor britânico Sting que estava presente e era contrário à obra. Durante aquele episódio, os indígenas exigiram a troca do nome da usina que era chamada de KARARAÔ, proibindo o uso dessa palavra sagrada que no seu vocabulário significa "Grito de Guerra" para dar nome ao projeto. A partir dali a usina passou a se chamar de Belo Monte. Considerada uma "OBRA TRÁGICA" pelo TCU que investiga o superfaturamento da usina, o grito de guerra dado no passado pela Índia Tuíra  com o seu facão, hoje continua com a caneta afiada do Juiz Sérgio Moro que tenta recuperar o dinheiro desviado dessa obra polêmica, que foi inicialmente orçada em 17 bilhões e embora ainda não concluída já consumiu mais de 30 bilhões. Em Belo Monte do Pontal, Cruzamos o Rio Xingu em uma balsa que faz a travessia entre as margens  num tempo aproximado de dez minutos. Ao contrário do que observamos na grande extensão da Transamazônica, neste ponto devido a largura do rio, não existe as famosas "pinguelas" que são pontes de madeira construídas sobre os inúmeros Igarapés ao longo da rodovia. Neste caso, o valor pago pela travessia vai para uma empresa privada que detém a concessão do serviço. Após a travessia do Rio Xingu, dirigimos por mais 75 km até  Anapu onde em 2005, a missionária estadunidense Dorothy Stang foi assassinada a mando dos latifundiários e fazendeiros que ela ousou enfrentar. Esse crime teve repercussão mundial e tornou-se um símbolo para lembrar a violência nos conflitos agrários que acontecem no Brasil. Já no Município de Pacajá, a Rodovia Transamazônica que na maioria da sua extensão é uma estrada plana, nesse trecho conhecido como Ladeira da Velha se torna bastante íngreme e sobre o local, devido aos constantes acidentes, surgiram várias lendas para explicar a origem do seu nome. Uma delas fala sobre a aparição de uma idosa que teria sido atropelada e morta naquele trecho da estrada. Outros falam que a tal velha foi uma saqueadora, que se aproveitava da vulnerabilidade dos caminhoneiros que ficavam atolados para ataca-los e roubar a carga. E numa terceira versão mais amigável, a velha seria uma pessoa do bem, uma espécie de Anjo da Guarda para os viajantes em apuros que a eles oferecia comida e abrigo. Após várias intervenções de engenharia e o asfaltamento da ladeira, os acidentes diminuíram mas muitas pessoas ainda se recordam das lendas que continua mexendo com o imaginário dos motoristas que trafegam pela Mítica Transamazônica. Próximo de Tucuruí, tivemos que atravessar no meio de  uma boiada que ocupava toda a pista e deixava o trânsito bastante lento. A cerca de 400 km de Belém passamos pela Usina de Tucuruí, considerada a maior usina 100% brasileira, já que Itaipu tem uma maior potência instalada, mas é dividida entre Brasil e Paraguai. Transpusemos o lago  sobre a sua barragem que tem 11km de comprimento por 78m de altura, de onde se tem uma  vista para o imenso lago onde as águas do Rio Tocantins são represadas pela maior obra de engenharia até hoje realizada na Amazônia. Depois de percorrer 780 km  em 12 horas de viagem chegamos em Belém por volta de 18:00 horas e fomos descansar para no dia seguinte começar a nossa maratona que prometia ser intensa. Como reservamos  dois dias para conhecer Belém, tivemos que otimizar a nossa estadia na Cidade das Mangueiras para ver somente o essencial. 

Comentários recentes

12.10 | 14:09

Brigado Ronaldo Salles. Grande abraço!

08.10 | 16:47

Maravilha de relato... Expedição fantástica !! Melhor ainda por que foi com esse icônico carro, Defender é símbolo de liberdade e aventura. Abraços de Landeir

27.04 | 22:41

Brigado Lelei. Um dia voltaremos! Grande abraço!👍

27.04 | 22:28

Que bacana..Parabéns..Quando quiserem Voltar estou a disposição. Abraço